sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Avatar FiliPêra

O Lutador

 

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Arte, seja lá qual for, não tem regras. Por mais parecida que a essência de uma obra seja com outra no passado, ela pode ser melhor, e isso só depende dos artistas envolvidos. Pense em quantas vezes você já viu no cinema a história do cara que faz aquilo que gosta, mas por um motivo qualquer é impedido de continuar, e, ao final, luta para a sua redenção/continuação. Muitas vezes. Só no boxe já consigo pensar em um clássico do naipe de Touro Indomável. The Wrestler (ou O Lutador, como é chamado por aqui), a mais nova obra-prima de Darren Aronofsky é sobre isso. Mas, como todas as obras de Darren até o momento, é muito mais. O filme ecoa Pi, com ataques psicóticos (em intensidade bem mais baixa, claro), ecoa o superlativo Réquiem Para um Sonho, com consumo de drogas levando a destruição, e ecoa A Fonte da Vida (sem os efeitos lisérgicos), com o apego incondicional de alguém a alguma coisa, ao ponto de enfrentar o próprio instinto de sobrevivência. É por isso que The Wrestler merece todos os prêmios que ganhou e todos os elogios que está amealhando pelo mundo afora. É um filme atemporal, sobre um cara que é um paquiderme social, cuja a única habilidade é participar das lutas coreografadas da wrestling.

Rourke, em uma interpretação inspiradíssima, é Randy “The Ram” Robinson. Ele não tem amigos além de seus colegas meio loucos de luta e uma striper gostosona (Marisa Tomei, linda e atuando como nunca), não tem glória ou qualquer motivação na vida e a não ser a da torcida. Mas, um dia, tudo isso acaba por ser tirado dele. No vestiário, após uma apresentação especialmente sangrenta, ele sofre um ataque cardíaco (cena atordoante) e vai parar no hospital. A conversa com o médico após acordar é quase uma sentença: ele não pode mais lutar, ou seu coração tem risco de deixar de funcionar. Simples e rápido. E aí vemos a primeira guinada do filme.

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Randy passa então a tentar colocar a vida nos cheios, já que nos últimos anos ele só viveu a reboque do passado, quando foi um grande campeão. Mas, mesmo que seus dias atuais na wrestling não sejam lá muito empolgantes, com falta de dinheiro e público reduzido, a vida “lá fora” é ainda mais patética para Randy. Mas ele tenta. Dá um upgrade no seu emprego diurno em um supermercado, passando do estoque para o atendimento da seção de frios. Somente a cena em que ele se prepara no corredor do supermercado, ouvindo gritos do seu nome, e encontrando um silêncio angustiante quando lá chega, já vale essa parte.

E, além de tentar “melhorar” de vida, Randy tenta resolver as coisas com a sua filha. Com o sucesso ele se afastou dela, e resolveu que agora, que podia morrer a qualquer momento, já que não é lá muito disciplinado, é hora de tentar se reconciliar. E Evan Rachel Wood, que faz o papel da filha de The Ram, apesar de não participar muito, também entrega uma atuação perfeita, indo do céu ao inferno em poucos segundos, mesmo com Rourke preferindo deixar esses problemas de família em segundo plano.

A segunda guinada narrativa de O Lutador acontece quando Randy chega a óbvia conclusão que essa vida não é pra ele. Ele quer voltar para os ringues, com sangue, arame farpado, vidros quebrados na cabeça e grampeadas pelo corpo. A oportunidade vem quando surge a oportunidade dele enfrentar um adversário antigo: o Aiatolá, que o venceu há vinte anos atrás. E para isso ele se apega com todas as suas forças a essa oportunidade, mesmo que isso signifique sua morte.

 

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Não, The Ram não quer uma redenção, ou uma volta por cima, a là Rocky Balboa. Ele simplesmente quer voltar a fazer aquilo que gosta. Com esse (aparentemente) fiapo de história, Aronofsky manda um filmaço, onde nada dá errado. Tá certo, o filme parece ter lá seus clichês, como a stripper que dá duro para criar o filho, ou uma volta ao passado familiar de Randy para recuperar o amor da filha. Mas está tudo tão acima da média, tão bem feito, que  parece inédito, verdadeiro. O trio principal de atores, Rourke (que se cortou de propósito durante as filmagens), Marisa e Evan dão show. Rourke faz o mais difícil: nos fazer torcer por um final feliz, mesmo sabendo que ele não será, e que Randy não foi o cara mais legal do mundo.

Também é impossível desassociar o próprio filme da trajetória de Rourke, que de galã de filmes como 9½ Semanas de Amor, O Selvagem da Motocicleta e Coração Satânico, foi pra sarjeta devido a vícios como o de álcool e heroína. A volta por cima veio com Sin City (tá bom, ele fez Era Uma Vez no México antes, mas nem se compara), na qual deu vida ao icônico Marv de forma perfeita (coisa que Eu achava impossível). Agora Rourke coloca seu nome na rota do Oscar, após ganhar o Globo de Ouro, superando Brad Pitt em O Curioso Caso de Benjamin Button (outro filmaço).

Aronofsky também dá show e mostra porque é um dos melhores diretores independentes que habitam Hollywood. Seu estilo intrusivo de filmar as lutas com a câmera na mão, mostrando inclusive os papos que os lutadores trocam entre si durante as lutas, foi genial. A câmera parece mais um personagem do filme que qualquer outra coisa, como no plano sequência arrepiante em que ela acompanha The Ram na entrada da luta contra o Aiatolá, ao som da música Sweet Child o Mine, do Guns ‘n Roses (Axl Rose cedeu os direitos da música gratuitamente, pois o orçamento do filme, de US$ 5 milhões, não conseguiria pagar por ela).

Ao final fica a pergunta de cunho filosófico: o que define uma pessoa? É o que ela é, ou o que ela faz? Por mais parecidas que as duas coisas possam ser,  Randy mostra que elas são diferentes. Não é nada conclusivo ou definitivo, mas tem um caminho bem traçado. Quando você pensou que tais coisas poderiam ser vistas num filme de luta livre mentirosa?

Faça um favor a você mesmo e assista!

 

The Wrestler (EUA, 2008)

Diretor: Darren Aronofsky

Duração: 115 min

Nota: 9,5

1 comentário

Anônimo disse...

Caras eu tava doido para ver alguma informação sobre esse filme, já queria ver ele por causa do Rourke, já que pra mim O Selvagem da Motocicleta é um ótimo filme, depois de ler isso só tenho uma coisa a dizer.

Quando posso ver esse filme ?

PS: Sou fã do Rocky Balboa

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