segunda-feira, 10 de maio de 2010

Avatar FiliPêra

Kick-Ass - Quebrando Tudo

 

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Não há nada de novo em Kick-Ass. É apenas uma versão hilária, exagerada e pop da velha máxima o que aconteceria se super-heróis fossem realistas, se eles tivessem inseridos no nosso mundo?, questão levada ao mundo dos quadrinhos por Watchmen. A síntese da tentativa louca de causar alguma surpresa com esse filme - que como todos sabem, é adaptado de uma HQ de Mark Millar - é logo revelada com alguns segundos, quando Dave Lizewski faz seu discurso e questiona de por quê nenhum jovem ter feito uma roupa e sair combatendo o crime por aí, influenciado por heróis de quadrinhos e da TV.

Mas esse questionamento é diluído em alguns minutos de filme. Estamos diante de uma sátira bem feita, e não de uma obra complexa que quer dar um passo adiante na obra mais importante de Alan Moore - um campo onde todos falharam miseravelmente, com raras exceções. O maior atrativo de Kick-Ass é justamente esse: o exagero. Tanto, que ele tá mais pra um blaxploitation japa, em alguns momentos, do que pra um blockbuster americano. A forma como ele não se ela a sério e usa isso tremendamente ao seu favor, ao criar cenas engraçadas e carregadas de referências modernas - Eu não quero morrer, ou não saberei o final de Lost! - é o seu diferencial frente a outros filmes de heróis situados em universos próprios e egoístas, como Homem-Aranha (pra citar o mais identificável dos heróis).

A trama é baba, e não traz nada de novo: Dave Lizewski é um garoto nova iorquino comum - daqueles excluídos, e que não são do tipo que as garotas gostam - que resolve ser herói, mesmo sem nenhuma motivação especial tipo uma aranha radioativa, ou assassinato dos pais. Mesmo que ele use um traje ridículo, daqueles que mais fazem rir do que amedrontar, a internet traz-lhe fama, e com esse fato, não demora e ele se envolve com gente da pesada. Logo de cara, ele toma uma surra homérica e é atropelado, já adiantando que será o tipo de herói que apanha. Mas essa adversidade lhe traz vantagens: suas terminações nervosas são prejudicadas e ele recebe reforços metálicos nos ossos, o que aumenta a resistência dele a dor. É isso!

 

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Pra ajudar, a turma do mal também é caricata, rasa e o vilão principal não passa de uma versão limitada do Rei do Crime - o típico chefe do crime organizado local. Parecia um filme comum, com um herói com nada de especial, que só sai por aí com dois bastões e tenta intimidar gangues… mas dois coadjuvantes hardcore mudam isso de forma drástica. Um é o herói Big Daddy, vivido por um Nicolas Cage divertido, e o outro é Hit Girl, na pele da endiabrada e inspirada Chloë Moretz, que quando crescer vai me deixar apaixonado por ela. Por mais que Kick seja o centro das atenções da parada, ele é o tipo de personagem principal arrasado por coadjuvantes, ou parece servir simplesmente de muleta para manter afastado do palco mais iluminado um personagem mais importante - uma espécie de Johnny Frost, em Coringa.

Mas se Kick-Ass tem um nome alternativo, ele é Hit Girl. Ela é como os pinguins de Madagascar, o Agente Smith de Matrix, ou Cassidy, de Preacher: ela deixa o personagem principal comendo poeira, e imprime sua marca no filme com a mesma desenvoltura com que abre as entranhas dos capangas imbecis. Quando ela entra em cena você sabe que algo sinistramente sangrento vai ocorrer. Ela é dona das melhores sequências do filme, de algumas das tiradas mais engraçadas, além de merecer um longa só dela. O filme ainda dá a ela - e ao pai - um background simples, mas contado de forma interessante, na forma de uma HQ em 3D, que soa mais ou menos como o anime dentro de Kill Bill Vol 1.  E no fundo é somente uma criança de 11 anos prematuramente violenta…

Infelizmente outros coadjuvantes não se saem tão bem. Red Mist - um herói vilanesco que serve mais como boi de piranha na trama - é fraquinho, e não acrescenta muita coisa ao filme, mesmo sendo interpretado por Christopher Mintz-Plasse, o conhecido McLovin, de Superbad. Os dois amigos de Dave se saem melhor, assim como a melhor-amiga-futura-namorada dele, e as situações engraçadas em que eles se metem valem o tempo de filme gasto com eles.

A veia 2.0 do filme é outro destaque. Kick-Ass é um herói com perfil no MySpace, com amigos e um monte de fãs o respondendo. Essa aproximação da web é apenas uma parte da estratégia do filme de “recriar” os super-heróis para um público adolescente. A própria fotografia do longa expõe esse desejo, me lembrando em alguns momentos a frenesi e a estética visual dos trailers de Scott Pilgrim - que é citado no filme. A Violência e a verborragia desbocada são quase pornográficas de tão intensas, e fazem parte dessa constante preocupação de aproximar tudo de um jeito mais jovial e acelerado de ser.

A diferença de Kick-Ass para outras tentativas pífias de fazer um filme com alma quadrinística - a moda hollywoodiana dos últimos anos -  é que ele é quadrinhos em todos os seus momentos, e não só porque é uma adaptação de uma das HQs independentes (independentes em termos, já que o autor e o desenhistas são tarimbados) mais hypadas dos últimos anos. A obra ainda esbanja toda uma verve urgente enquanto encontra tempo para referenciar até mesmo clássicos dos faroestes, com uma trilha sonora típica dos confrontos no deserto, e enquadramentos mais fechados.

Outro detalhe que distancia Kick-Ass da miríade de filmes de quadrinhos que sai a todo mês, é literalmente a preocupação de chutar bundas. O filme é uma emulação louca e com o sentido explícito de puramente divertir - nunca chocar - além de ser embrulhado num pacote com a indigesta classificação R, que somente permite menores de idade assistir acompanhados de maiores de idade. Mas, infelizmente ele não se decide pela abordagem que vai estabelecer. Em seus primeiros momentos ele é realista: Kick-Ass é um herói patético que causa mais risada que qualquer outra coisa. E logo depois ele se volta para um mundo mais próximo do original dos super-heróis, ao colocar em cena a dupla pai e filha. E aí tudo se torna uma orgia louca de referências escancaradas. O resultado, mesmo interessante e polido, passa uma sensação incômoda de indecisão. Embora esse detalhe faça pouca diferença no fim das contas, uma abordagem mais concisa, com certeza, ajudaria na obtenção de um produto final mais refinado.

Kick-Ass também representa uma espécie de evolução da jornada do diretor Matthew Vaughn. Ele é um cara que ficou como coadjuvante de Guy Ritchie nos dois filmes fundamentais dele: Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes, e Snatch - Porcos e Diamantes. Ritchie se revelaria um diretor medíocres em seus filmes seguintes, enquanto Vaughn começaria uma pequena escalada à margem de Hollywood. Viriam Layer Cake e Stardust, dois bons filmes que o catapultariam para a direção de um filme hollywoodiano de pequenas grandes proporções, no caso esse.

Porém, mercadologicamente, Kick-Ass é mais importante do que cinematograficamente. Não só a não-preocupação com censura - o filme é recheado de violência gráfica e palavrões, 80% disso graças a uma menina de 11 anos, o que garante ao filme um estranho ar rebelde - mas o hype inteiramente baseado no boca-a-boca, e a busca por estúdios acontecendo de forma inversa (a Liongate comprou o filme com ele praticamente pronto, após uma exibição matadora na San Diego Comic-Con). É uma bem-vinda fórmula independente de se produzir um filão de HQs com um conteúdo um pouco diferente do habitual. Por esse ângulo, Kick-Ass se aproxima mais de  Sin City do que de filmes pirotécnicos de heróis, e soa como um genuíno filme de quadrinhos frente a um monte de lixo recheado de merchandising e planejamento para licenciamento de bonecos que sai todos os anos. E essa fúria sarcástica emana positivamente em quase todos os minutos na tela.

 

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Mas, infelizmente, o conjunto é por demais desconexo para representar um passo adiante nos filmes baseados quadrinhos. O resultado garante uma boa dose de diversão desenfreada, mas não se firma um modelo cinematográfico a ser seguido. É um conjunto efervescente de sangue, palavrões e sujeira, mas tudo com uma capa adolescente de pudor, e até uma certa inocência, tudo delineado por uma trama que nunca avança. É praticamente a real releitura do Homem-Aranha do século XXI. Porém, com o peso e qualidade de Batman e Homem de Ferro no cinemas, é difícil que seja lembrado, a não ser por adolescentes e jovens que se preocupam com Lost e YouTube.

Com certeza é tudo que Kick-Ass queria…

 

Kick-Ass (EUA, 2010)

Diretor: Matthew Vaughn

Duração: 117 min

Nota: 7

10 Comentaram...

Albertinhoo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Nossa acabei de assistir o filme, iria fazer a resenha no meu blog e quando passo aqui para ver o que há de novo tcharan, encontro o filme que acabei de assistir xD, apesar das poucas diferenças do quadrinhos. Eu gostei.

spider reclamão disse...

Bem,baixou o filme né? Porque só estréia dia 11 de junho ou estou muito enganado!? Aguardarei o filme sair nas telonas para assistir, pela resenha boas risadas na certa.

Anônimo disse...

Ainda não vi o filme, mas estou com espectativas, pelo que vi da resenha que você falou que seriam os pontos fracos do filme, não me pareceram tanto. Espero que tenha sido uma bela adaptação e mantido o ar despretensioso da HQ, pelo menos na minha visão essa foi uma das idéias da hq, não queria ser séria, apenas divertir, e assim espero do filme.

Unknown disse...

Um filme despretensioso mas com certo charme, tem nicolas cage mas quem arrasa mesmo e a hit girl com cenas de acao incriveis (em especial a cena final, cult) as tiradas sarcasticas tb sao dez!!

Moziel T.Monk disse...

Assisti domingo último e também planejava escrever a respeito, mas o senhor Filipera estragou mais um ex-post meu. Disse tudo que eu pretendia dizer!!!:)
Agora falando sério, talvez os mais xiitas fãs não se agradem das mudanças na história ou de algumas poucas concessões às "fórmulas" de filmes (convenhamos, o kick-ass do fiilme se dá muito bem se comparado ao do gibi). Mas a história ficou na medida pra agradar os fãs menos radicais e o público que não conhece a revista. E a Hit Girl é uma capetinha desbocada e sanguinária! Tem futuro...

Aleatório disse...

Eu gostei do filme, quem quiser baixar tem lá no anarquia os links (se ninguém ainda deletou o post), ainda não li o HQ mas pelo o que falavam eu esperava mais sangue e mais palvrões.

Quero dizer que eu achei muito fofa a Chloë Moretz com sainha de colegial e a pistola na boca do porteiro/segurança *--* Essa menina já tem o meu coração assim que ela fizer 18 xD

Nilto, o Junio disse...

Odeio a mania que hollywood tem de mudar a história dos personagens, porra, o Big Daddy não é aquilo. E eles tiraram a parte mais maneira da hq, mas a Hit girl ficou especialmente foda

Arthur Araújo disse...

Pois é, tb senti o impacto da mudança do background do Big Daddy = /

A revelação da verdadeira história dele era um dos pontos mais impactantes da HQ e no filme isso se perdeu u.u

E eu acho que o Kick-Ass com final ultra-fodido da HQ respondia de forma mais interessante a questão sobre o que aconteceria se alguém tentasse vestir uma fantasia e se tornar um super herói XD

Isadora disse...

Parabéns pela resenha! Eu já tinha visto uma preview do filme e fiquei com muita vontade de ver. E depois de ler aqui, a vontade aumentou, e sabendo os pontos mais fracos, vou conseguir ter uma opinião melhor sobre o que eu achei do filme.
Já estava na hora de fazerem um filme de super-herois, onde não tenha nada sobrenatural envolvendo o mocinho, esse clichê de 'preciso salvar o mundo e meu amor' já cansou...

Abraços!!

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