Besouro pode ser um filmão ou simplesmente mediano, tudo depende do que você espera dele. Obviamente ele foi vendido como um filme de ação, com coreografias de luta elegantes e requintadas, muito diferente do “normal” em filmes nacionais, onde a técnica fica para segundo plano. E Besouro tem tudo o que promete… embora em doses menores do que provavelmente você está esperando e acompanhou pelo material divulgado.
E por esse motivo ele se assemelha bastante a O Tigre e o Dragão, guardadas as devidas proporções. Está mais para um filme pacifista, reflexivo e com elementos amorosos do que propriamente uma hora e meia de pancadaria que quebra as leis da física sem dó. E é aqui que está a possível faca de dois gumes: a história é simples do início ao fim, com personagens simplórios, mas que funcionam para o propósito do filme sem problema nenhum, mas fica a impressão que poderiam explorar melhor o conceito de capoeirista no estilo Wuxia, que foi a idéia vendida desde o início, como você viu no nosso preview.
Besouro é o típico herói relutante que com o decorrer da história vai “crescendo” e ficando mais consciente da sua missão. Principalmente após passar por certas provações. Ele é um escravo, e vive numa fazenda de cana-de-açúcar no recôncavo baiano, que tem um coronel dos piores, e um capataz ainda mais sinistro. Após a morte do seu mestre de capoeira, Alípio, ele foge para a mata e tem contato com os orixás, que o treinam para que ele inicie uma luta em favor dos escravos e contra a cultura escravagista - que persistia em pleno século XX.
Antes mesmo de estrear Besouro já é destaque por um motivo: é pioneiro no sentido de fugir do lugar-comum do cinema nacional, recheado de filmes sobre bandidagem (da qual saíram pelo menos duas obras-primas, Cidade de Deus e Tropa de Elite), filmes sobre o Nordeste (que geraram o filmaço Cinema, Aspirinas e Urubus), comédias com atores da Globo (nada de muito bom por aqui) e outras coisas que você está careca de ver (ou de ouvir falar). Besouro é um filme de ação clássico, com narrativa fortemente calcada na mais-que-conhecida jornada do Herói.
Mas ele vai ainda mais além e possui uma técnica primorosa, aliado a um trabalho de fotografia que é um show à parte. Somente as cenas xamânicas, em que Besouro incorpora animais e vemos tudo numa visão em primeira pessoa, submergindo na água, pulando como um sapo, ou voando como um inseto, já valem o filme. Mas o filme tem mais, muito mais. Os longos minutos de silêncio absoluto, quando o herói entra em contato com orixás, aliado a uma narrativa e uma edição eficaz, são algumas das melhores sequências que vi no cinema nacional nos últimos tempos. A predominância do amarelo também é destaque, assim como a caracterização primorosa dos orixás.
Só senti falta de mais cenas de luta, afinal estamos falando de um herói capoeirista “que avoa”. A luta de Besouro pela libertação de seu povo é um pouco mais subjetiva do que aparenta, e suas ações são mais para incentivar aos escravos que lutem (mesmo que muitos deles nem o apóiem) do que propriamente cair na mão com tudo quanto é jagunço. É claro que a forma como as ações subversivas dele inspiram os escravos a lutar é bem interessante, mas a narrativa acabou não focar nem a subversão nem a pancadaria, o que resulta num vazio no roteiro.
Faltou também A luta final. Não sou tão fã de narrativas simplórias, com início-meio-clímax, mas se um filme tem início e meio normais, espero um clímax digno, e não tive um. A sensação de decepção foi mais ou menos parecida com a que senti ao terminar de ver Matrix Revolutions, embora o derradeiro capítulo da saga de Neo tenha sido brochante, o que não foi o caso aqui!
A própria história tem lá seus defeitos. O triângulo amoroso entre os amigos de infância Besouro, Quero-Quero e Dinorah não é lá dos mais bens construídos, e mais serve para colocar elementos amorosos no filme do que propriamente para enriquece-lo. A sucessão de momentos Besouro destrói algo, e os fazendeiros o perseguem também cansa em alguns momentos, mesmo que seja tudo muito bem executado, e com uma boa narrativa que não tem qualquer problema em chutar as regras da linearidade, misturando lembranças e pensamentos em tudo.
Mas se Besouro em parte falha como uma experiência cinematográfica - principalmente no quesito história - ele acerta em cheio como uma experiência visual, assim como um belo retrato da cultura negra e da capoeira. Nesses elementos a ênfase no visual acima da história se mostra uma aposta correta, que gera resultados como a belíssima cena de luta na árvore, desde já uma das coisas mais grandiosas que já vi no cinema nacional. Mas quem for esperando um samurai à brasileira vai se decepcionar. Mas que a iniciativa seja vista com bons olhos por produtores e diretores no nosso tão repetitivo cinema.
Besouro (Brasil, 2009)
Diretor: João Daniel Tikhomiroff
Duração: 95 min
Nota: 7,5
6 Comentaram...
Eu me decepcionei. Devia ter lutas do início ao fim, mas sem descuidar da história. Bom, vale por ser o filme nacional mais original que já vi.
Ouvi algumas críticas negativas, mas o trailer me chamou a atenção. Mesmo assim vou conferir.
Como capoeirista, fiquei MUITO decepcionado.
Tiveram uma grande oportunidade de fazer um filme que ficasse à altura de nossa luta dançada nacional, e o que fizeram? Trouxeram um chinês pra estragar toda sutileza e elegância da capoeira! Como exemplo dou outro filme que também fala de um capoeirsta: Madame Satã. Apesar de bem menos cenas de luta, ele retrata visualmente muito bem o que é capoeira, vide a cena em que ele dá uma rasteira no cara e termina o movimento segurando o chapéu. Agora colocaram o ator pra chutar três caras ao mesmo tempo, no estilo Jackie Chan, e o fim do movimento é uma base travada, típica do Kung fu. Cadê a ginga? Eu achei uma farsa pra gringo ver, o que infelizmente prejudica a capoeria como um todo, pois os gringos vão querer aprender aquelas prezepadas achando que é capoeira e sempre vai ter um "sabichão" disposto a "ensiná-los" por alguns US$. E a capoeira cada vez mais sendo descaracterizada... Fora a parte musical, que ficou ridícula, as poucas cenas em que tem um berimbau, é extremamente mal-tocado. E a musica tema é rock´n roll! Fala sério... os caras estavam no recõncavo baiano, um dos lugares mais ricos musicalmente que eu conheço e botam o tema de besouro com guitarra? Resumindo, achei um péssimo filme, nota zero, infelizmente...
Galera temos que lembrar que o Besouro realmente
existiu, não existe porque colocar lutas de mais aonde não é...e o ponto é esse ele quase não luta, mas instiga o povo negro a lutar pela própria liberdade, esse é o diferencial de um herói brasileiro, e um super herói americano q bate em todo mundo mas não mata ninguém e ninguém consegue matar ele ou vai atraz dele depois.
Minha opinião
Att. Sonegheti
besouro entra pra historia do cinema nacional, simplesmente por contar a história da luta dos escravos pela liberdade.......
O filme deve ser elogiado por muitas qualidades. O visual é deslumbrante e a técnica da primeira pessoa muito bem utilizada. E o mais importante: sai da mesmice que assola nosso cimena.
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