quarta-feira, 21 de outubro de 2009

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[Capetalismo #2] São Jorge pode ser pior que o Dragão

 

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OK, entendemos a inflação, assim como suas causas e malefícios para uma economia capitalista. Agora que já temos informações sobre a doença, é hora de aprendermos sobre a "cura" para ela, bem como o frágil equilíbrio que existe para manter uma economia crescendo e sem inflação. Mas antes é preciso responder alguns comentários deixados no primeiro texto dessa coluna. Dois Anônimos (como sempre) se fixaram na minha afirmação de que inflação é natural, e é até bom para uma economia; e a taxaram de idiota. Como não deram argumentos que diziam em que exatamente a afirmação estava errada, mesmo depois de Eu ter provado na teoria que ela estava correta, não posso contra-argumentar. Olhemos um caso importante para vermos na prática como a inflação está associada a crescimento.

O Japão não tem inflação - em alguns momentos tem deflação, que é queda no valor dos preços - há uns bons 10 anos. NADA de inflação mesmo, os preços caem. Aparentemente é ótimo, e em outros tempos Eu admiraria isso, mas é só darmos uma olhada no índice de crescimento econômico do país no mesmo período para chegarmos a conclusão que ele não está crescendo NADA também. Tá bom, NADA é meio forte, afinal podemos ver o PIB (no próximo post, falaremos sobre PIB) crescer a até 2%. Parece grande coisa, mas estamos falando da segunda maior economia do mundo (agora ex-segunda maior, a China ocupa o posto, e está a firmes passos para o primeiro lugar), e um integrante do time chamado Tigres Asiáticos.

Motivos para essa inércia são vários, e estão ligados mais a tradição de poupador do povo japonês, do que qualquer coisa. Ao mínimo sinal de crise, eles se põe a economizar dinheiro em suas casas, e não nos bancos, o que causa rombos significativos na economia, como veremos mais para frente. O efeito é duplo: deixa os bancos com problemas (bancos são o pilar central de uma economia capitalista, e a razão da concentração de renda ser tão aguda) e não gastam dinheiro, e como o PIB japonês tem por alto uns 70% de dependência de consumo familiar, isso leva a economia pra baixo. E sem gente comprando, os preços se mantém estáveis, fruto do desespero dos comerciantes, porém a economia não cresce. Mas, cada um interpreta esses números a seu modo. Se quiserem mais casos, é só pegar os índices de crescimento do PIB e variação de inflação de países em recessão, e tirem a prova.

Apesar de termos uma economia dinâmica amplamente liberal, o governo tem diversas ferramentas para deixar a economia - e principalmente o vilão da inflação - sob controle. Essas ferramentas são três, e são denominadas política fiscal, política monetária e política cambial. Elas são mais ou menos conhecidas de todos, mas suas funções vão muito além das aparências e têm efeitos muito mais profundos do que parece.

Cada uma dessas ferramentas terá um texto exclusivo para ela, então, espere que a Batalha contra a Inflação seja extensa. O objetivo de todas elas é o mesmo: fazer a economia crescer ao máximo, com uma taxa de inflação aceitável (relembrando: essa taxa no Brasil é de 4,5%, variando 2 pontos percentuais para cima ou para baixo). O uso de cada uma dessas ferramentas se difere quanto a área econômica em que ela irá combater a inflação e os recursos que usam para isso.

Vamos nos ater ao combate de duas formas de inflação: a de consumo (que de tão importante recebe a atenção das políticas fiscal e monetária) e de custo, que é o campo da política cambial, já que o dólar é a moeda internacional desde a década de 70, quando viram que o esquema ouro-dólar não funcionaria (mais disso quando chegarmos de fato à política cambial), e os preços de matérias-primas variam de acordo com o dólar. O combate aos outros tipos de inflação são específicos e variam muito de caso a caso, exigindo estudos somente interessantes para quem realmente quer ser Economista.

 

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Mas uma coisa é importante frisar: uma política pode desfazer uma merda de outra. E adivinha em cima de quem a coisa estoura quando a situação tá negra de verdade? Sim, dos consumidores, resumindo, Eu e Você. Vamos a um exemplo clássico. Existe a inflação de lucro, que surge quando algum empresário decide que merece ganhar mais do que está ganhando no momento. Em vários setores a concorrência acirrada não o deixaria ir muito longe, mas há o setor dos preços administrados, que dependem de aprovação do governo para aumento, como falamos no texto passado. Nesses setores, como água, luz, telefone; surgem monopólios, pois em quase todos os casos, somente uma empresa pode operar em cada área. O fato é que, mesmo que teoricamente o aumento de preços deva estar ligado a variações econômicas muito fortes (aumento de dólar, ou de produtos essenciais para a realização do serviço), pois trata-se de um serviço público, a coisa não funciona assim, pois como se espera, os lucros devem existir, e geralmente são elevados.

Aqui no Espírito Santo quem cuida das instalações elétricas é a Escelsa, que recentemente, à exemplo de várias outras empresas, aumentou o valor dos seus serviços em quase 30%, sem direito a choro. Isso com a economia estável como não se via a muito tempo... Ao invés de colocar a Aneel para pegar as empresas elétricas pelo pescoço e exigir explicações quanto a esse aumento, o governo prefere ir pelo caminho mais fácil, para evitar que os preços do IPC-A vão às alturas. Eles sabem que não deixaremos de usar luz por causa de um aumento, então a preocupação deles é cortar o crédito (com menos dinheiro na mão, o brasileiro inevitavelmente recorre ao crédito) para que compremos menos e os preços de outros produtos se mantenham estáveis, ou até caiam. É dessa forma que as coisas funcionam. Não corta o mal pela raiz (monopólios ávidos por uma grana), mas jogam tudo nos consumidores, prejudicando, além do nosso bolso, o setor comercial. É como quando a gente usa um analgésico após uma fratura, ou uma bolsa de gelo após bater a cabeça. Não resolve o problema, porém diminui a dor, e até pode mascarar o verdadeiro problema.

Comecemos então pela política fiscal. Ela atua em duas frentes: na arrecadação do governo, ou impostos; e gastos públicos, que é onde o governo aplica essa grana toda. Falando assim, você já deve estar entendendo. O governo tem o poder de arrancar dinheiro de quem quiser, e o quanto quiser, e essa é sua ferramenta mais poderosa. A importância dos impostos no combate a inflação é grande, pois tirando dinheiro dos consumidores via impostos, o dinheiro disponível para compras é menor, assim como o volume dessas compras, tornando praticamente impossível haver inflação de consumo.

Dessa forma, os varejistas (acredite: de todos os setores econômicos, eles são os que mais sofrem) não podem aumentar preços, os mantendo estáveis. É isso que basicamente o governo faz para manter preços estáveis em muitos casos. Quando eles estão baixos e é do interesse dele que haja aumento, eles criam ou elevam impostos diretamente nas matérias-primas dos produtos para que esses preços se elevem, ou ainda taxa compras, tudo depende da criatividade deles, e da situação do Legislativo. É claro que esse tipo de medida é altamente impopular, além de criar uma alta artificial nos preços, e leva ao desaquecimento econômico, mas cria o impressão de um poder de compra maior em alguns casos, e é isso que interessa aos governos que precisam se reeleger de quatro em quatro anos. Geralmente são feitos acordos nos bastidores com redes de mídia para não divulgarem aumentos de impostos ou jogadas desse tipo, mas como existe gente do setor de comunicação dos dois lados geralmente esse tipo de coisa vaza, mesmo sendo difícil saber em quem acreditar (por isso que audiência conta tanto, pois o povão sempre acredita nos maiores).

A outra frente, os gastos públicos, envolve os investimentos que o governo faz com os impostos que arrecada. Muito da economia depende de investimentos em setores como educação, moradia, saúde, construção, infra-estrutura. Todo investimento desse tipo envolve geração de empregos e renda, e aumentar, ou diminui-los é também uma arma do governo no combate a inflação. Mais uma vez o PIB paga, pois aumentar a carga de impostos diminui a capacidade das empresas de gerarem empregos, bem como a geração de riquezas, e como resultado o PIB estaciona. O problema maior do Brasil é que os que controlam a política econômica só pensam a curto prazo por motivos eleitorais óbvios. Dessa forma toda a política fiscal brasileira é extremamente restritiva, não investindo em infra-estrutura como estradas, portos, eletricidade, que são como a base de sustentação para a economia aguentar o crescimento posterior. Dessa forma, os impostos aumentam, os gastos públicos diminuem, tudo em nome de conter a inflação, e economia paga com crescimento do PIB na base dos 4% ao ano, enquanto temos o caso da China que cresce 10% há uns bons 15 anos.

 

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O Brasil tradicionalmente é violento com os impostos, não tendo dó ou piedade de quem os paga. É só se observar que o país está quebrando recorde após recorde de arrecadação, e isso não parece mudar. Desde o início do Plano Real que a política é essa. Em 2008 foi um ano especial. O Congresso aprovou no fim de 2007, a suspensão da CPMF, o chamado imposto do cheque, que taxava em 0,38% todas as operações financeiras, e colocava algo em torno de 40 bilhões de reais nos bolsos do governo sem esforços. Para compensar esse rombo, o governo resolve fazer o que sabe melhor: aumentar outros impostos, como o IOF. Resultado? Outro recorde de arrecadação em 2008, ultrapassando a meta de R$ 640 bilhões. Isso foi 9% mais que o arrecadado em 2007. Sim, quase 10% mais dinheiro taxado...

Impostos também são uma forma de concentrar grana somente na Classe A, deixando o restante da população da Classe C pra baixo, com menos dinheiro. Isso acontece da seguinte forma: vamos imaginar o caso do Seu João, que ganha 800 reais, é casado e tem dois filhos. Seu João gasta cerca de 200 reais com alimentos, que têm cerca de 30% do seu valor vindo de impostos, mais 300 com aluguel, mais 200 com água, luz e telefone. TUDO isso aí tem cerca de 20 a 30% de impostos também. Então, mais ou menos 25% do salário do Seu João vai todo para os bolsos de bundões que ganham para levantar a mão enquanto alguém lê alguma coisa em uma tribuna. Temos também o Sr. Clóvis, funcionário de uma respeitada multinacional, que ganha 8 mil reais por mês. Suponhamos que ele gaste 4 mil com despesas diversas como a do Seu João, e guarde o restante, para investir. Ele pode aplicar o dinheiro em um fundo de ações da Petrobrás, a maior estatal do Brasil. Os 30% do salário do Seu João também vão para a Petrobrás. E quando a Petrobrás lucra, o Sr. Clóvis também recebe. Então, BEM teoricamente parte do dinheiro do Seu João vai para o bolso do Sr. Clóvis.

A raiz do problema está em onde os impostos são cobrados, em sua imensa maioria, de produtos e compras. E isso todos fazem, mas o pobre gasta uma maior porcentagem do salário com compras, que são altamente taxadas com impostos. Então, relativamente, o pobre (não só o pobre, mas toda a classe média também) paga mais impostos que os ricos. E não venham com esse papo que Imposto de Renda serve pra minimizar isso, pois quem ganha milzinho e quinhetos por mês tá longe de ser rico. Pessoas Jurídicas, por outro lado, têm pouquíssimos impostos sobre seus lucros, e aí que mora o problema maior: produtos que todos compram são excessivamente taxados, enquanto empresas (tô falando das realmente grandes, principalmente estrangeiras) têm seus lucros livres. A grana deles é limpa, mas a nossa não!

Mas como praticamente tudo no Capitalismo tem uma função secundária, a Política Fiscal tem uma função por trás da de controlar a inflação. Em tempos como o atual, com economia estável (nós fomos o país que melhor passou pela tal Crise no mundo) e inflação absolutamente controlada, por que se justificam tantos impostos e diminuição dos gastos do governo? O motivo para isso, bem como sua existência é a razão para o fato de todos os governos parecerem iguais, além de ser como uma coleira que serve para perpetuar o Capitalismo através das Eras. Resumindo: é o vilão de todo o Sistema Econômico Moderno.

 

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Para muitos esse vilão é a corrupção. Aparentemente, e com todo o esforço da mídia, isso parece uma verdade absoluta. Corrupção é uma merda, e suga dinheiro público como mosquitos sugam sangue. Mas do ponto de vista geral, é um mal menor, cujo problema está mais para fatores judiciários do que econômicos. A corrupção, e a impunidade, mostram quão falhos são os conceitos de Justiça no país... porém, estupram a economia menos do que você imagina. Mais para frente vou mostrar isso matematicamente. Em outros tempos, o Vilão era chamado de Dívida Externa, e a sigla FMI não saía da boca do povo. Mas o Governo Lula pagou a dívida (com grande publicidade envolvida, devo acrescentar. Hoje o Brasil até empresta dinheiro pra outros países) e essa mesma política continua, com sucessivos recordes de impostos e todas essas coisas que a gente já conhece.

Uma das coisas que justifica esses recordes e arrochos de gastos é o superávit fiscal. Quando as receitas do governo (impostos, lucros de estatais) superam suas despesas (salários, manutenção, e investimentos) em um período de tempo, isso é chamado de superávit fiscal, ou primário, para ser mais exato. Os números, tanto absolutos quanto relativos não param de subir. Essa grana é guardada, e hoje ela representa aproximadamente 4,5% do PIB (teve uma queda por causa do desaquecimento da Economia, em função da suposta Crise). Como esse dinheiro é poupado, é de se imaginar que seja bom para o país, pois representa reservas de dinheiro. Mas a inflação não permite que guardemos tanto, já que o dinheiro vale 5% menos por ano (em 2008 foram juntos cerca de 118 BILHÕES de reais), então para onde ele vai? É o que você saberá em breve!

Até lá...

6 Comentaram...

Anônimo disse...

tl;dr

Anônimo disse...

Caras, cês tão de parabéns! Muito bom o blog de vcs. Um dos meus blogs de referência, um dos que eu acesso praticamente todos os dias pra ver se tem novidades...e normalmente tem. Achei estranha a crítica que o Eudes fez a um de vcs, que nem sei qual, sobre a ex-nerdice. Ser nerd ou não ser? Gostar de quadrinhos e da net de maneira viciantes não é ser nerd? Longa vida ao NSN!!!!

A Voz do Além disse...

@Anônimo...

Na verdade o Eudes não criticou a gente, mas sim o André Forastieri (através de um link que eu indiquei no Twitter), que danou a falar besteiras sobre nerds, sendo que ele é um!

E muito obrigado pelos elogios =D

Mr. Abott disse...

Ótima coluna Filipe. Nunca vi ninguém "fora da área" comentar tão bem sobre a política econômica como você.

Quais suas referências para estes posts? Gostaria de buscar mais informações.

Abraços e continue com o ótimo trabalho.

Purple-Headed Tang Chasa disse...

Esse post foi ligeiramente pior que o anterior, mas continuou sendo muito interessate e denovo Filipêra você está de parabens.

Esse texto está me fazendo pensar um pouco mais sobre o peso da midia em culpar a corrupção por tudo, ainda não tinha me tocado disso.

Anônimo disse...

FiliPêra Parabéns cara muito boa essa matéria não vejo a hora de conferir os outros posts dessa série.
Sou um leitor fiel do blog e fasso propaganda aki na minha cidade Pouso Alegre MG
abras de Luis Fellipe Menezes

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