quinta-feira, 8 de julho de 2010

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Morte de um Dissidente

Por Paulo Roberto, do Em Paralello 

 

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Poucos devem se recordar, mas em 2006, Alexander Litvinenko, diante das câmeras de jornalistas do mundo inteiro, se deixou mostrar para acusar um dos homens mais poderosos do mundo. Envenenado por um componente químico mortal chamado de Polônio-210, com a aparência frágil, debilitada, Sasha, como era chamado por seus amigos e familiares, acusou nada menos que o presidente russo Vladimir Putin de ser o responsável por sua eminente morte. Este livro conta exatamente a história desse crime, bem como a dinâmica da política russa e seus meandros, principalmente as razões pelos quais Putin chegou ao poder.

O Tenente Coronel Alexander Litvinenko não era um homem qualquer; antes de se tornar um dissidente, ele era um dos homens de confiança de Boris Berezovski, um empresário russo que era uma grande influência no círculo de decisões de Yeltsin. O próprio Boris foi quem impulsionou (por baixo dos panos, é claro) Yeltsin a demover um general altamente condecorado para a nomeação de Vladimir Putin a diretoria da FSB (a antiga KGB, o serviço secreto russo).

Em 1998 surge o motivo que levou Alexander Litvinenko a se tornar um dissidente russo. Até então agente da FSB, Sasha convoca uma coletiva de imprensa e, ao lado de quatro agentes mascarados, confirma suas alegações. Ele diz que alguns generais transgressores da FSB conspiraram para matar Boris Berezovski. Após essas alegações, Sasha foi preso e levado para Lefortovo - uma prisão sob domínio da FSB, que era tida como centro de investigações da extinta KGB - sob a alegação de ter agredido um suspeito durante uma investigação. Meses depois foi solto e novamente preso por uma acusação semelhante.

Em Outubro de 2000, Alex Goldfarb, ativista político e biólogo que trabalhava para o famoso investidor George Soros, recebe uma ligação de Boris Berezovski, que depois de ter se tornado um dos homens mais poderosos da Rússia, se encontrava exilado em sua casa na França. Boris ligou para Goldfarb para lhe pedir ajuda, em busca de auxílio para Sasha que, se sentindo cada vez mais ameaçado, pegou sua mulher e filho e fugiu para a Turquia.

Goldfarb conhecia a história de Sasha e todos os acontecimentos de anos atrás. Ele mesmo, na época em que Litvinenko estava preso, contatou Boris no intuito de entrevistar Sasha, como parte de um programa de erradicação da tuberculose. Embora tivesse acesso a várias prisões da Rússia, o mesmo sabia que a entrevista de um ex-prisioneiro de Lefortovo, um domínio da FSB, traria uma credibilidade muito maior a sua matéria.

Decidido então a ajudar Sasha (também por ser um dissidente), Goldfarb conduz a família Litvinenko até Ancara - passando por Istambul - e por fim a Inglaterra, onde tinham planos de pedir asilo político. Ainda com medo de serem deportados, Sasha e sua família se estabeleceram na Inglaterra com ajuda financeira de Boris quando, por fim, conseguiram o tão sonhado asilo britânico. Alguns anos depois, em um café na Inglaterra, Sasha é envenenado pelo Polônio-210, e agonizando no hospital, mais uma vez ele retorna as lentes das câmeras para acusar o então presidente russo.

 

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Diante de inúmeros fatos e acontecimentos históricos que o livro descreve, chego a conclusão de que Sasha foi uma espécie de fantoche de Boris Berezovski, pois o mesmo sentia-se traído por Putin que. por sua vez, soube aproveitar as oportunidades mesmo não incluindo Boris em seu círculo de confiança.

O governo Yeltsin foi marcado por um caráter destrutivo aos interesses das massas do povo russo. As estatais foram privatizadas, a apropriação do bloco de riquezas sociais significou uma catástrofe para a classe trabalhadora, que rapidamente se viram em situação de miséria. O PIB da Rússia caiu pela metade, os índices de mortalidade aumentaram em 50%, o rublo, em 1998, perdeu 70% de seu valor em apenas no mês de agosto, contudo, oligarcas russos se tornavam bilionários e tantos outros novos milionários surgiam enquanto a guerra na Chechênia estourava.

Dentre esses oligarcas estava Boris Berezovski, que passou de um simples empresário do ramo automobilístico, a “fazedor de reis”, como era chamado nos corredores da política russa. Boris conseguiu derrubar antigos funcionários “chave” e colocou pessoas de sua confiança no lugar, o que proporcionava a ele o controle de nada menos que a Aeroflot, uma empresa russa de aviões, a ORT, maior rede de televisão estatal da época e a Sibneft, uma grande companhia de petróleo. Hoje, Boris é supostamente o controlador da MSI, empresa baseada na Inglaterra e representada no Brasil pelo iraniano Kia Jorabchian. Empresa esta que, em 2004, firmou um contrato de patrocínio com o Corinthians e três anos depois se viu sendo investigada pelo Ministério Publico, com a acusação de ter formado um esquema milionário de lavagem de dinheiro juntamente com o clube paulista. O Ministério Público pediu a prisão preventiva de Boris, através da Interpol para investigar suas conexões com a empresa, que é claro não eram diretas, provando mais uma vez o seu caráter aproveitador. Boris, a meu ver, jamais se preocupou com Sasha, mas sim consigo mesmo e sua vingança.

Putin é um fruto indireto de Boris, na verdade foi um tiro que saiu pela culatra. Com a ajuda de Berezovski, Putin se elegeu em 2000 com mais de sessenta milhões de votos, nas eleições de 2004 com mais de 70% dos votos. Qual a razão pela qual Putin teve e ainda tem essa grande aprovação da população Russa que chegou a 77% em 2006? A economia em sua gestão cresceu aos módicos 10% do PIB em 2000, visto que em 1998 a inflação chegou a 86% ao ano consideramos uma significativa melhora.

As grandes massas puderam observar uma relativa melhora em relação a 1998, contudo o governo de Putin não chega a se igualar a de Yeltsin, mas algumas medidas iguais foram adotadas, como a privatização de boa parte das empresas estatais que somente na área energética - a exemplo da Gazprom (dentre várias), que em 2005 foi vendida por 166 milhões de dólares -, hoje são estimadas em 7,5 bilhões. Essa medida foi igualmente tomada com o intuito de passar as mãos de aliados do então presidente os principais negócios do estado, embora igualmente fraudulenta tais medidas se diferiram por um pequeno aspecto: foi feita de forma estratégica buscando uma posição de força. Yeltsin em seu governo precisava dos oligarcas para vencer os comunistas, agora Putin pode facilmente prendê-los se quiser.

O país durante seus mandatos foi mantido sob muito rigor e censura a imprensa. Estima-se que 75 jornalistas foram atacados e 8 foram mortos em 2007, números negados, é claro, pelo então presidente da Rússia, inclusive a morte de Sasha.

Hoje os russos vivem em um país que ainda não chegou ao primeiro mundo e com níveis altos de corrupção, mas, olhando para trás, onde a população quase desceu ao patamar das nações africanas mais pobres, a situação agora parece ter melhorado. Em janeiro deste ano, a inflação passou a 12% ao ano, conseqüentemente o custo de vida aumenta, acarretando o aquecimento da economia, o crédito popular está aumentando obrigando os bancos a pedirem dinheiro emprestado no exterior dada a falta de liquidez. Alguns especialistas dizem que a mistura de incompetência e ganância é justamente a junção que possivelmente derrubará o governo Putin. Em 2008, Putin entregou a presidência a Dmitri Medvedev, eleito pelo povo que logo depois nomeou Putin primeiro – ministro do país reforçando os rumores que a Rússia ainda é governada por ele.

 

Um ponto realmente importante no livro se refere ao seu conteúdo histórico e político. Ao longo da obra somos levados não só a entender o real motivo do ódio instaurado entre Putin e Sasha, mas todo panorama da política russa, partindo das privatizações que assolaram o país a partir da queda do comunismo. Também é explicado como, se valendo desses milhões, oligarcas russos como Boris foram traídos por Putin, que deu lugar a antigos quadros do serviço soviético, enquanto a guerra voltava a estourar na Tchetchênia. Se você, como nosso caro amigo FiliPêra/Voz do Além, curte política russa, ou como eu, filmes de espionagem, vale a pena a leitura deste livro que te prenderá do início ao fim.

 

Wikipedia (2) | Pedro Doria | WSWS.org

 

Título: Morte de Um Dissidente

Subtítulo: O envenenamento de Alexander Litvinenko

Editora: Companhia das Letras

Número de Páginas: 456

Preço: R$ 44,90

Nota: 9

2 Comentaram...

eu disse...

Cara isso é desonestidade falar das privatizações como se elas fossem a causa das mazelas, como se fosse algo ruim em si, só revela sua tendencia esquerdista e pouco conhecimento sobre o assunto e economia em geral, deixo para te só uma pergunta, qual país do mundo tem um sistema de transportes, internet , telefonia, bancário, sistema energético etc, que seja estatal e eficiente? coreia do norte?

Paulo Roberto [Em Paralello] disse...

@eu

Acho que você precisa ler novamente o texto e entender o que foi escrito. Não culpei de forma alguma as privatizações em si como sendo a "causa das mazelas", deixe-me explicar:

Tanto no governo Ieltsin quanto no Governo Putin as privatizações tiveram apenas um objetivo: Poder! Como dito no texto:

"Essa medida foi igualmente tomada com o intuito de passar as mãos de aliados do então presidente os principais negócios do estado, embora igualmente fraudulenta tais medidas se diferiram por um pequeno aspecto: foi feita de forma estratégica buscando uma posição de força."

Como você pode ver critiquei a forma fraudulenta como as mesmas foram efetuadas. Não sou a favor nem contra as privatizações (depende do caso em específico) nem tão pouco esquerdista, sou apolítico assumido.

Por fim deixo um texto do Jornalista Ethevaldo Siqueira que fala um pouco sobre os ricos da gestão estatal e privada que gostei muito:

"Os riscos de cada lado

Como pressuposto, podemos afirmar que existe muita virtude em cada um dos modelos de gestão pública ou privada. Mas há, igualmente, inegáveis riscos quando se faz a opção por um ou outro modelo.

No caso da empresa pública ou estatal, como sabemos, os maiores riscos são o empreguismo, a ineficiência, a baixa produtividade e a corrupção. Se for monopólio estatal, então, as perspectivas se agravam.

No caso da empresa privada de serviços públicos, o maior risco é seu poder corruptor sobre os organismos públicos e sua resistência permanente em atender aos objetivos sociais e de inclusão digital. O pecado capital da operadora privada não é visar ao lucro, como muitos esquerdistas jurássicos costumam dizer, pois nem a empresa pública pode abrir mão de uma operação superavitária. Em sentido geral, não se pode confundir empresa com entidade filantrópica ou instituição de caridade.

A grande lição que o mundo nos tem ensinado é de que não há concessionária eficiente sem fiscalização rigorosa e permanente, do governo, e sem a ação independente e altamente profissional da agência reguladora, inclusive na criação de um ambiente de competição crescente.

Em lugar de uma desgastante disputa entre os defensores dos dois modelos, com acusações intermináveis de lado a lado, o que realmente vale a pena é refletirmos sobre as diferenças fundamentais entre as duas opções. E, do ponto de vista ideológico, fugirmos dos extremos, popularmente conhecidos como extrema direita e extrema esquerda."

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