sexta-feira, 29 de maio de 2009

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Glaspost #5 – Shturmovik, o ar e o pão do Exército Vermelho

Por Moziel T.Monk

 

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“Vocês estão desapontando o seu país e o Exército Vermelho. Até o momento vocês não acharam conveniente produzir o Il-2. O Il-2 é hoje tão essencial ao nosso Exército quanto o ar e o pão. Shenkman produz apenas um Il-2 por dia e Tretyakov, um ou dois MiG-3 por dia. Isso é um insulto à nossa pátria e ao Exército Vermelho. Nós precisamos de Il-2, não dos MiG. Se a fábrica número 18 pretende enfraquecer nossa pátria entregando apenas um Il-2 por dia, ela está cometendo um grande erro e terá que pagar por isso. Eu peço-lhes para não abusarem da paciência de nosso governo e a produzirem mais Il-2. Que isso seja um último aviso a vocês dois.”

Esse texto é a reprodução de um famoso telegrama enviado por ninguém menos que Josef Stalin aos dois dirigentes das fábricas 1 e 18 de aviões de combate no final do ano de 1941 em plena II Guerra Mundial, com a União Soviética sendo invadida pela poderosa máquina de guerra do III Reich. Vindo de quem veio, essa bronca poderia significar que, se Shenkman e Tretyakov não fizessem o que Stalin queria, provavelmente acabariam seus dias congelando as bolas em um GULAG nos cafundós da Sibéria. E por isso o recado foi plenamente entendido, já que a produção diária de Il-2 na fábrica 18 pulou de 1 para 7 aeronaves e a fábrica 1 passou a entregar 3 dessas diariamente. Isso já em janeiro de 1942. Ao todo, seriam produzidos incríveis 35.952 aeronaves da família Il-2, e se considerarmos a produção de outras variantes, como o Il-8, Il-10 e Il-16, o número excede as 40 mil unidades, além das mais de 7000 produzidas sob licença na Tchecoslováquia, o que torna o Il-2 a aeronave militar mais produzida na história.

Mas que avião é esse, que costumeiramente é pouco lembrado entre os maiores “Warbirds” da II Guerra, como os americanos P-47 e P-51, os alemães Me-109 ou Foke-wulf e os ingleses Spitfire e Hurricane? Que avião é esse que era considerado por Stalin tão importante quanto “o ar e o pão” para o Exército Vermelho? Mesmo não tão famoso entre os aficionados por aeronaves da II Guerra Mundial, o seu papel nos combates do Front Leste foi de grande importância para deter o avanço das forças blindadas alemãs no território da “Mãe Rússia”.

O desenvolvimento do Ilyushin Il-2 Shtumovik começou no final dos anos 30, visando criar uma aeronave capaz de suplantar o novo avião de ataque tático Su-2, já que os militares soviéticos perceberam que o projeto da Sukhoi seria pouco eficiente em combate ao enfrentar as novas armas e táticas antiaéreas. A principal ênfase dada ao projeto foi na capacidade de sobrevivência da aeronave, que foi provida de uma fuselagem ao mesmo tempo aerodinâmica e blindada, construída em aço. Houve especial atenção ao corpo central, com partes vitais como cabine, motor, sistema de óleo, de combustível e radiadores de água e óleo protegidos por blindagem ainda mais reforçada. A espessura variava entre 4 e 8 mm.

A cabine ainda receberia um pára-brisa com blindagem transparente de 65 mm de espessura, algo inédito até então em aeronaves soviéticas. Das 4 toneladas e meia da aeronave, a blindagem era responsável por quase uma tonelada. Os primeiros protótipos traziam um segundo tripulante como artilheiro de uma metralhadora móvel, mas essa posição foi suplantada nas aeronaves de série. Como armamento ele recebeu dois canhões 20 mm e 800 kg de bombas, transportadas em compartimentos internos. Devido ao peso e com um motor de 1350 Hp, a velocidade máxima que a versão de produção atingia era de 450 km/h, algo lento se comparado a outras aeronaves.

A produção foi iniciada no início de 1941, mas com um ritmo lento. Tanto, que quando a Alemanha de Hitler decidiu romper o Pacto de Não-Agressão e invadiu a União Soviética em junho de 1941, poucas aeronaves haviam sido entregues, e a produção precisou ser interrompida em outubro daquele ano. Porém, as poucas aeronaves em serviço naquelas primeiras semanas de combate no Front Leste mostraram serviço, e o alto comando percebeu que o Il-2 poderia significar a diferença entre vitória ou derrota, e decidiram priorizar a produção da nova aeronave.

Já os alemães tiveram uma péssima surpresa com a atuação dos “Ilyushas”. A Luftwaffe já conhecia boa parte das aeronaves e táticas dos soviéticos devido a experiência adquirida com os combates durante a Guerra Civil Espanhola. Mas aquele conceito de aeronave era novo, e os pilotos soviéticos passaram a empregar novas táticas ao usar o Il-2 e deter o avanço das temidas divisões Panzer alemãs. Isso tudo se tornou um grande empecilho, e o Il-2 era uma verdadeira visão do inferno para os carros de combate alemães.

 

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Para se ter uma idéia da eficiência do projeto de Ilyushin, vamos a alguns números: o ás do modelo, o piloto Alksandr Nikolayevitch Yefimov, destruiu 126 carros de combate, quase 200 unidades de artilharia, 43 canhões antiaéreos, 85 aeronaves em solo e 30 locomotivas. Uma unidade de Il-2 terminou a guerra com 30 mil missões, das quais conseguiu destruir 2500 tanques de combate, 12000 veículos, 50 locomotivas, 450 vagões, 400 aviões em terra e 150 em combate aéreo. Na famosa batalha de Kursk, em julho de 1943, consta que 70 blindados alemães foram dizimados por Il-2 em apenas vinte minutos de combate. E apesar das condições de combate, há registro de aeronaves Il-2 que conseguiam retornar a base mesmo após ter sido alvejado mais de 600 vezes, inclusive com as superfícies de comando comprometidas.

Todavia isso teve um preço. Mesmo com reforçada blindagem, a aeronave era relativamente lenta, nos primeiros meses de combate raramente tinha escolta de outros caças e a retirada da posição do artilheiro na posição de ré se mostrou um erro, pois além da pesada artilharia antiaérea, os Il-2 tinham que enfrentar os caças da Luftwaffe. Não obstante ter boa manobrabilidade em baixa altitude, a função principal do avião era o ataque ao solo. Isso tudo somado resultou em grande número de perdas. Em média, um Il-2 durava de 26 a 30 missões, uma sobrevida baixa se comparada a outras aeronaves. Mas pouquíssimas aeronaves enfrentavam o que os Il-2 precisavam encarar, tampouco sob as mesmas condições.

Para sanar as deficiências observadas na primeira versão de produção, outra versão (Il-2m) entrou em produção e começou a combater em outubro de 1942, trazendo um segundo tripulante como artilheiro de ré. Porém, essa apresentou problemas e sofreu modificações aerodinâmicas, se chegando à versão Il-2m3. Além do artilheiro de ré, outras mudanças foram a substituição dos canhões 20 mm por de 23 mm e a inclusão de duas metralhadoras fixas ShKAS de 7,62mm e uma metralhadora móvel Berezin 12,7 mm. Outros armamentos foram adicionados ao arsenal disponível de bombas, como os foguetes não guiados perfurantes de blindagem RS-82 e a PTAB-2.5-1.5 (ProtivoTankovaya AviaBomba, ou bomba aérea antitanque), pequeno artefato penetrante de blindagem, os quais eram levados às centenas pelos Il-2, cujo compartimento interno cabia 220 dessas bombas, que também poderiam ser transportadas na forma de uma única bomba fragmentária (cluster) com 196 desses artefatos. Em um ataque, a nuvem formada por essas bombas obliterava qualquer veículo blindado. Infelizmente a posição do artilheiro, por se tratar de quase uma “gambiarra” não era contemplada com a proteção da blindagem, e ser tripulante nessa posição era quase suicídio, havendo um número grande de baixas desses artilheiros em combate.

Além de incrementos, como posterior a troca dos canhões 23 mm por versões de 37 mm, outras versões da aeronave surgiram nos meses da guerra, como o Il-2KR (reconhecimento) e o Il-2U (treinamento) e o Il-8 (versão com motor de 2000 hp). Mas a principal mudança foi o Il-10, que resolveu o problema da velocidade baixa com melhorias na aerodinâmica e a substituição do motor por um mais potente, de 2000 Hp, com o qual chegou a atingir a velocidade de 551 km/h. Entrou em combate no início de 1945, com as forças soviéticas já rumando em direção a Berlim. Outra variante foi o Il-16, um Il-10 mais leve, com motor de 2300 hp e mais veloz (630 km/h), mas que teve vida curta, com pouco mais de 50 unidades produzidas, principalmente por problemas que ocorreram durante a operação dessa versão.

 

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Ao fim da II Guerra Mundial, os exemplares que sobreviveram ainda serviriam em países do Bloco Soviético, mas em poucos anos a era dos aviões a jato tornaria a maioria das aeronaves veteranas da II Guerra obsoletas, e pouquíssimos exemplares sobreviveram incólumes até os nossos dias, os quais podem ser encontrados em museus da Rússia e da República Tcheca.

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*Moziel T.Monk é autor do Blodega e nos enviou esse excelente texto por email

3 Comentaram...

MPauloS disse...

Os aviões atuais são muito velozes e bonitos, mas, não possuem o charme dos caças da 2 guerra.

Naevio disse...

a união sovietica mostrou a força do regime socialista!

Anônimo disse...

A desorganização da sociedade e do Estado russo provocada pela invasão germânica, ocasionou a impossibilidade de se produzir aviões com funcionamento eficiente; afinal, a situação principal enfrentada pela burocracia soviética foi, inicialmente, resistir ao avanço da Werhmarcht. Não havia tempo e recursos para a produção de arma aérea altamente eficiente.

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