quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Avatar FiliPêra

O “Poeta da Libertinagem” em São Paulo

 

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Manara trocando uma idéia com alguns brasucas!

Por volta de cinco da tarde da quinta-feira (dia 18), uma fila respeitável, com umas oitenta pessoas, já se aglomerava no interior da  Oficina Cultural Oswald de Andrade,  onde em duas horas Milo Manara participaria de um bate-papo com fãs, curiosos e outros tipos de pessoas interessadas em ouvir as palavras de um mestre das HQs eróticas. Na entrada da Oficina, a Conrad havia montado um estande onde as obras mais recentes do autor - Kama Sutra e um especial com quatro volumes de Clic - e tava vendendo igual água, graças a um anúncio que dizia que Milo faria uma sessão de autógrafos às 21h.

Ainda na fila conheci dois viciados em quadrinhos - desses que me lembram que não posso me enquadrar na categoria de viciados em quadrinhos -, que despejaram vários relatos interessantes de eventos similares de bate-papo que eles participaram. Desde a petulância e arrogância de Robert Crumb na passagem dele por São Paulo - o que, segundo os Viciados, pode ser encarado como uma coisa boa, no caso dele -, até a descrição de um desenho que Will Eisner fez, mostrando The Spirit parabenizando a Mônica (da Turma da Mônica) por entrar no hall dos grandes personagens dos quadrinhos… tudo entrou no papo dos três. E Eu só ouvindo, enquanto aguardávamos a distribuição das senhas.

Com as senhas em mão, fomos para outra saga: conseguir fones de ouvido com traduções simultâneas, já que Manara só fala em italiano. A mulher encarregada da distribuição dos fones tava mais acelerada do que hamster eletrificado, repetindo as mesmas instruções a cada três segundos e ainda tentando manter o sorriso de atendente de telemarketing. Conseguimos os fomes e vimos o debate se iniciar… para a imprensa. Tínhamos duas opções: continuar a conversa, ou ficar ouvindo toda a papagaiada da imprensa pelos fones. Obviamente desligamos os fones, não queríamos ouvir perguntas como “De onde você tira sua inspiração?” que os caros jornalistas insistiam em perguntar a cada segundo.

Com uns parcos quinze minutos de atraso, a imprensa começa a se retirar da sala de debate e nos preparamos pra entrar, e foi só aí que percebemos que uma enorme fila havia se formado e que éramos os primeiros dela.

 

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Uma foto ruim da mesa. Manara ao lado de Claudio Curcio

Logo de cara, já mandam um anúncio que faz a platéia exclamar um “ahhhhhh”: Manara estava com problemas de saúde e não participaria da sessão de autógrafos marcada para às 21 horas. Tudo culpa do ar condicionado alto por dois dias seguidos. Ele explicaria mais detalhadamente o problema logo que começou a falar.

Manara não é um qualquer. Apesar de ser primordialmente conhecido por suas HQs eróticas, com mulheres possuidoras de uma anatomia mignon bem característica, ele fez inúmeros outros trabalhos, como sua conhecida parceria com Federico Fellini. Esse ecletismo já foi deixado claro na apresentação do evento, feito pelo jornalista Gonçalo Júnior, provavelmente o maior pesquisador de HQs do Brasil, e autor do livro Tentação à Italiana. Gonçalo descreveu de forma sucinta - e sintetizada, por causa do tempo - diversas influências e os primórdios das primeiras manifestações gráficas de erotismo provindas da Itália. Na mesa também estava Claudio Curcio, organizador da Napoli Comicon - que se tornaria meu desafeto minutos depois.

Após as falas iniciais, que resumiram bem a trajetória de Manara, vieram as perguntas, surpreendentemente inteligentes. A primeira disse respeito a questão aventura das histórias de Manara, que misturam muito bem o erotismo com um espírito desbravador, na maioria das vezes. Manara disse que essa influência é de Hugo Pratt, provavelmente o melhor roteirista de histórias essencialmente aventureiras que conheço. Muito das histórias de Pratt pode ser reparado nos roteiros de Manara, principalmente na construção de paisagens complexas, fruto de pesquisas extensas. Ele aproveitou o tema para fazer uma reflexão sociológica, dizendo que a sociedade (que Eu defino como Sociedade Ocidental, ou mais amplamente como Sociedade Urbana) em que vivemos não incentiva a Aventura, simplesmente pra manter as pessoas tensas e obedientes. Seria a consolidação da Cultura do Medo contra a Cultura Lúdica. Tirando das pessoas o máximo de opções para escapar de uma rotina entediante, a Aventura se vai e o que fica são os mesmos grupos de poder no controle, amparados por por pessoas presas a rotinas entediantes e estafantes e com medo de perderem aceitação social e sustento. A Ficção, para Manara, seria mais do que o puro escapismo, seria um incentivo ao retorno desse espírito aventureiro, da busca pelo prazer - não só sexual.

Uma outra pessoa perguntou justamente sobre as paisagens que ele compõe para integrar seus desenhos eróticos. Ele respondeu que a questão tem muito a ver com verossimilhança, de criar imagens críveis. As paisagens seriam complementos que inserem a beleza dos corpos femininos numa construção que ocupa um espaço real. Para ele, os cenários são tão importantes quanto a anatomia feminina, mesmo passando praticamente despercebidos na maioria dos olhares dos leitores.

As outras perguntas foram quase todas relacionadas ao processo criativo dele, principalmente aos desenhos da série Bórgia, feita em parceria com o gênio Alejandro Jodorowsky. Manara descreveu o detalhamento dos roteiros dele, que tornavam desnecessárias explicações posteriores sobre aspectos da arte. O resultado é uma das obras mais interessantes e que melhor retratam a luxúria e corrupção do período de influências da poderosa Família Bórgia - outra obrigatória é o livro Os Bórgias, de Mario Puzo.

 

Após o fim do bate-papo, infelizmente abreviado, fui para a abertura da exposição - os nerds com que Eu tava trocando idéia foram conversar com personalidades dos quadrinhos, tipo Sidney Gusman, Maurício de Souza e o próprio Gonçalo Júnior. Após umas taças de champanhe e de vinho, e de ver as várias fotos belíssimas da exposição - algumas mostrando a parceria de Manara com Federico Fellini, por exemplo - uma estranha movimentação se agigantou num dos cantos do salão. Sim, o Velho Tarado resolveu dar alguns autógrafos antes de ir embora e o fato espalhou um pequeno Caos. Coloquei nas mãos minha edição de Encontro Fatal que estava debaixo do braço e começo a persegui-lo e tentar passar por cima da multidão que começava a crescer em volta dele.

Quando Manara estava a ponto de pegar minha revista pra autografar, Claudio Curcio, que além de curador do Napoli Comicon é um gigantão dos maiores, colocou o braço no meio e exclamou algo que entendi como SEM MAIS! Sabendo que ele entende inglês - e Manara não - mandei logo um Son of a bitch que ele com certeza ouviu. Fora da exposição, no pátio principal do salão, no caminho pra pegar um táxi, outra multidão fica na frente de Manara. Minha chance! Eu berro um É per un amico, que ele entende e para pra olhar de olhar de onde veio. Estou bem de frente a ele. Donna? ele pergunta. Si, respondo… ele esboça um sorriso, mulher é com ele mesmo. Ele pergunta o nome da amiga… Eu digo e ele não entende. Eu soletro! Ele pergunta meu nome e entende quando digo Filipi! Depois escreve os dois nomes e autografa a obra.

Com a missão cumprida, volto para o albergue e na volta ainda encontro o Alessio no metrô. Vamos para um bar qualquer na rua Augusta, nos encontramos com um povo acima de qualquer suspeita e a minha primeira noite em São Paulo termina ali…

 

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Eu e o Alessio, numa foto classificada de semi-gay

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E o resto do povo… com meninas lindas, que é isso que importa!

5 Comentaram...

Anônimo disse...

cara chamando o Curcio de filho da puta vc passa a imagem do brasileiro débil mental macaco mal educado, os deixe isso para o seu amigo retardado ai dessa foto.

FiliPêra disse...

@Mauro Tavares...

Mal educado foi ele que colocou o braço na minha frente, praticamente me deu um empurrão e me impediu de pegar um autógrafo, principalmente porque o Manara ia assinar (e acabou assinando depois). Tratei a todos com respeito e não vou ficar pagando pau pra estrangeiro. Se o Manara fosse manter o protocolo e não autografar nenhuma revista, ele que dissesse - como disse depois, quando estava realmente cansado - ao invés desse senhor quase me agredir.

Anônimo disse...

Pagar pau vc paga felipe, nem preciso dizer, a questão aqui é educação. Se determinados estrangeiros (como warren ellis, pra quem vc paga pau)acham que no Brasil só tem gente estúpida, é por causa desses comportamentos.

Ou vc acha que artista é obrigado a ficar assinando autografo? Claro que não é, isso só pras pessoas ficarem se gabando depois, dizendo "eu peguei um autografo e tal".

Se eu vou a um país e me chamam de filho da puta eu não volto lá. Eu estava no evento e achei todo mundo educado e respeitador com o público.

FiliPêra disse...

@Mauro Tavares...

sim, todo o mundo foi respeitador, até o momento em que ele meteu o braço pra cima da revista que Eu tinha estendido pro Manara (pro Manara, não pra ele). Bastava ele ter dito que o Manara tava indo embora, que tava cansado (ele mesmo não deu sinal disso, e tava autografando todas as revistas, e por vontade própria, já que havia dito anteriormente que não autografaria nenhuma) que Eu entenderia e iria embora (como já estava indo, até ver que ele tava distribuindo autógrafos). Agora, ao invés de simplesmente pedir (não havia muita gente), ele preferiu partir pra truculência, o que considerei uma extrema falta de educação da parte dele, coisa que Eu jamais faria em lugar algum, principalmente fora do meu país (e principalmente com pessoas que sustentam a indústria que paga o salário dele).

Mas você prefere simplesmente escancarar o fato de Eu ter chamado-o de "filho da puta" pra ficar falando sobre estrangeiros e falta de educação, não se atendo ao ato de truculência dele. E quando disse que não pago pau pra estrangeiros, disse que os trato como trato qualquer pessoa. Agradeci ao Manara pela gentileza (ele estava autografando e não empurrou ninguém ou reclamou de nada, ao contrário do Curcio, que não tinha nada a ver com a história), da mesma forma como agradeceria o Maurício de Souza, por exemplo. Xinguei o Curcio da mesma forma que xinguei qualquer pessoa que fizesse aquilo comigo.

spider reclamão disse...

Pessoal, vamos esquecer essas discussões. Diga lá Filipêra, quem é a deusa ali da esquerda, a com um casaquinho (?) azul. Fale que eu caso com ela. xDD

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