Por FiliPêra
David Lynch é especialista em filmes esquisitos, com climas macabros, e personagens dos mais exóticos; tudo isso pontuado por uma trilha sonora envolvente, que serve para complementar (e aumentar) o efeito claustrofóbico causado pelas imagens criadas por ele. Sua narrativa, na maioria dos casos, fica na fronteira do real com um imaginário dos mais pertubadores. Em quase todos os casos a resolução da trama gera teorias individuais. E ele não se contenta enquanto não mostra a face mais obscura e escondida do que está retratando. É o caso de seus filmes mais famosos, como: Cidade dos Sonhos, Veludo Azul, Estrada Perdida, e até sua estréia: Eraserhead.
Mas Homem-Elefante foge à regra. O filme narra a tocante história de um famoso personagem da Londres do século XIX; John Merrick, ou como era mais conhecido, O Homem-Elefante. Merrick era um ser grotesco, que sofria de uma deformação terrível. Sua cabeça, a parte mais atingida do corpo, era grotesca e desproporcional (fato que lhe valeu o apelido). Seu destino era servir como atração principal em um circo de aberração. E como pode-se imaginar John não era feliz, fora diagnosticado várias vezes como retardado e sem chances de desenvolver qualquer inteligência, por causa da sua quase impossibilidade de falar.
Mas tudo muda na vida dele quando o Dr. Frederick Treves (Anthony Hopkins) o descobre e o leva para um hospital. Lá ele recebe um bom tratamento e começa a se liberar intelectualmente, se revelando uma pessoa sensível e inteligente, além de sociável. Mas ele acaba por se tornar uma celebridade quando a Sra. Kendal, uma famosa atriz do teatral visita Merrick. À partir daí, vira moda entre a sociedade londrina visita-lo. Mas ele não faz só isso, ela também dá a John um espelho. Ele até então não havia visto sua própria imagem, fato que acaba por ajuda-lo na recuperação da sua própria imagem, e no aumento de sua auto-estima.
Apesar de ter dito que o filme foge à regra do cinema tradicional de Lynch, ele contém inúmeros elementos em comum com o habitual do cineasta: a fotografia (preto e branca, igual Eraserhead) com forte acentuação de sombras e luzes é um deles. A trilha sonora, pesada, mas ao mesmo tempo tocante é outro, o que com certeza vai garantir comparações com o filme anterior do cineasta: o já citado Eraserhead. Outra coisa em comum com o seu filme anterior é o fato de lidar com um personagem deformado (a filha de Lynch nasceu com os pés deformados, fato que ajudou a inspira-lo para Eraserhead), mas diferentemente do bebê deformado, filho de Henry Spencer, ele é aceito pela socieade, e não somente um mote para mostrar as dificuldades da paternidade e do abandono.
Um fato interessante é o final (não se preocupe, sem spoilers), que me lembrou bastante o final da obra-prima de Alan Moore, Do Inferno (a HQ, não a adaptação cinematográfica). Merrick aparece rapidamente, e serve para demontrar a genialidade de Moore, ao levantar a teoria (através de Jack, o Estripador) de que Merrick seria considerado uma divindade na India, pois seria considerado uma reencarnação do deus hindu Ganesha.
O final das duas obras evocam teorias sobre vida após a morte, espiritualismo, entre outros assuntos. Mas apesar da densidade, a obra também funciona perfeitamente como um retrato da aceitação da sociedade perante pessoas diferentes. É um lado quase desconhecido de David Lynch.
The Elephant Man (EUA/Inglaterra, 1980)
Diretor: David Lynch
Duração: 124 min
Nota: 8,5
comente primeiro!